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STF: especialista explica impactos da decisão que afasta incidência de ITCMD sobre planos de previdência privada
O Supremo Tribunal Federal – STF afastou, na última semana, a incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCMD sobre fundos de previdência do tipo Vida Gerador de Benefício Livre – VGBL e Plano Gerador de Benefício Livre – PGBL, caso o titular morra. A conclusão da análise ocorreu no dia 13 de dezembro, em plenário virtual, e a unanimidade dos ministros seguiu o voto de Dias Toffoli, relator da ação.
O resultado do julgamento, por ser de repercussão geral, impacta desde planejamentos sucessórios até processos de inventário e contratos familiares, como explica a advogada Simone Tassinari Cardoso, membro da Comissão de Direito das Sucessões do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.
Segundo ela, a principal mudança é a padronização da tributação nos Estados, que até então têm regras diferentes sobre a incidência ou não do imposto de herança.
“O ITCMD está sujeito a 27 regulamentações administrativas especiais, o que resulta em impactos sucessórios distintos em cada unidade da federação, como as formas de pagamento, as modalidades de declaração, as faixas de isenções e até mesmo as alíquotas. Em números, isso significa que, se um herdeiro recebe R$ 1 milhão de herança em um Estado com tributação de 8%, ele ficará com R$ 920 mil, enquanto em um Estado com tributação de 2%, o valor será de R$ 980 mil. Ou seja, há uma diferença de R$ 60 mil”, afirma.
Ela argumenta que não é aceitável que um mesmo fato seja tratado como sujeito à tributação em um Estado e não em outro.
“A regra geral sobre a matriz de incidência e a teoria geral do Direito Tributário são federais, não admitindo vicissitudes estaduais. Uma mesma natureza jurídica não pode ser tratada como tributável em um Estado e não tributável em outro. Esse foi o motivo da repercussão geral e do impacto de uniformização da jurisprudência que o STF promove”, explica.
Aplicação retroativa
Outra dúvida levantada pela decisão da Corte Suprema diz respeito à aplicabilidade retroativa da decisão, ou seja, a possibilidade de restituição do imposto pago e à modulação dos efeitos, o que significa saber a partir de quando a inconstitucionalidade será aplicada.
“Ao se posicionar sobre temas de grande impacto financeiro como este, o STF geralmente lida com três aspectos: a definição da constitucionalidade ou inconstitucionalidade da norma, a identificação dos destinatários da declaração de inconstitucionalidade e a modulação dos efeitos da decisão, isto é, quando e como ela se aplica. A modulação pode ser material, temporal ou modal, dependendo do tipo de efeito que a Corte deseja atribuir à sua decisão”, explica Simone Tassinari.
A especialista explica que ainda não é possível prever se o STF irá estabelecer uma modulação dos efeitos na decisão.
“Se o STF optar por modular os efeitos, a decisão fixará um entendimento claro sobre os limites da inconstitucionalidade que definirá se os contribuintes poderão reaver os valores ou se a restituição será limitada a períodos específicos. No caso de não haver modulação, cada contribuinte precisará ajuizar uma ação para declarar o pagamento indevido e pleitear a restituição dos valores”, pontua.
“Essas famílias sentirão um impacto imediato, principalmente em estados como o Rio de Janeiro, onde o ITCMD é retido diretamente na agência bancária antes da liberação dos valores. Com a inconstitucionalidade declarada, os valores deverão ser liberados sem o imposto, uma vez que a verba de previdência privada não é considerada parte da herança, mas sim de uma natureza distinta – verba securitária ou previdenciária”, explica.
Planejamento sucessório
Simone Tassinari ressalta que a decisão do STF também impacta o planejamento sucessório, a proteção da legítima e a divisão da meação nos regimes de bens comuns.
“Embora a decisão tenha como foco a eliminação da tributação do ITCMD sobre esses valores, ela reflete também sobre a proteção do patrimônio individual no contexto familiar. Em regimes de comunhão de bens, por exemplo, a questão da meação — ou seja, a parte do patrimônio que é devida ao cônjuge — e a legítima dos herdeiros deverão ser respeitadas no momento da liberação dos valores da previdência privada”, avalia.
A advogada entende que isso implica na necessidade de garantir que a meação do cônjuge sobrevivente e a legítima dos herdeiros sejam preservadas antes que os valores sejam liberados ao beneficiário, o que deve exigir um processo de verificação.
“Esse efeito colateral abre um campo novo para a atuação dos profissionais especializados em Direito das Famílias e Sucessões, já que o STF não está apenas tratando da tributação, mas reafirmando o respeito aos direitos sucessórios em relação a esses valores. A decisão não deve ser vista como um salvo-conduto para possíveis fraudes, mas sim como uma forma de garantir que a previdência privada, ao ser utilizada no contexto sucessório, respeite as normas legais de divisão do patrimônio”, pontua.
Em relação ao planejamento sucessório, a especialista também vê um impacto significativo no que diz respeito ao fortalecimento da previdência privada como instrumento de proteção e planejamento financeiro.
“A previdência privada oferece liquidez imediata aos herdeiros, algo essencial para o pagamento das despesas do inventário e para atender às necessidades dos vulneráveis, como moradias, cuidados de saúde e terapias. Isso a torna uma solução prática e eficiente para famílias que precisam de recursos rápidos, sem a sobrecarga tributária do ITCMD”, explica.
Holdings
Além disso, a especialista observa que associar a previdência privada com as holdings pode, ainda, suprir deficiências importantes, como a proteção dos vulneráveis e na manutenção do patrimônio familiar.
“As holdings podem garantir a continuidade do patrimônio, ao mesmo tempo que a previdência privada proporciona os recursos líquidos necessários para o cumprimento das obrigações sucessórias e familiares”, defende.
Além disso, ela argumenta que, no contexto de eliminação do inventário ou na entrega dos bens em vida, a previdência privada retoma sua posição como uma ferramenta de segurança para o planejamento sucessório.
“Essa decisão gera segurança jurídica, permitindo às famílias que possuem esses planos manter seus projetos de planejamento sucessório sem a necessidade de alterar seu planejamento, porque os fundos de previdência continuam a ser uma solução ágil, lícita e eficaz”, analisa.
Por Guilherme Gomes
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